Eu sou eu Alexandre Caruso, ou simplesmente, Caruso. Muitos me perguntam se o projeto “Garrafa no Mar” é meu mesmo e por isso resolvi contar um pouco dessa história. Mesmo relutante, por sempre gostar de ficar atrás do palco, fui convencido a “revelar” quem estava por trás do projeto “Garrafa no Mar”.
Por vários motivos. Um deles seria porque neste tipo de projeto, o nível de doação do ser humano, eu considero o mais alto de todos, ou seja, doar por pura empatia pelo próximo, doar por acreditar no próprio ser humano.
Infelizmente, nossa realidade construiu um padrão de se esperar uma fraude, desconfiar de ações voluntárias como essas, somado ao individualismo e ao não-coletivismo. Temos que vencer a todo custo e a todo instante e, na maior parte das vezes, não nos preocuparmos se os outros, – com exceção de nossa família – , estão bem ou não e como podemos ajudá-los.
O ponto positivo é que também temos muitas ações, ONGs, organizações civis que ajudam em diversas outras frentes.
Mas são instituições ou projetos já com uma história consolidada, um reconhecimento e uma reputação plenamente formados com uma rede fiel de voluntários, o que é bem diferente de nós.
COMO NASCEU O PROJETO
Tentando simplificar ao máximo possível, sou um cara de TI, que já teve uma fintech, uma startup financeira e que tive que aprender muito sobre pagamentos eletrônicos, boletos, etc. Em meados de junho de 2020, quando a pandemia estava ascendente, ouvi uma frase que me marcou muito: “teremos mais falidos do que falecidos”.
Não quero entrar no mérito da discussão saúde física x saúde financeira, mas o fato é que muitas pessoas perderam seus empregos, suas fontes de renda e não têm a quem recorrer para ajudar. Vi sim, muitas “vaquinhas” de distribuição de cestas, uma mobilização sem precedentes. Mas e as contas das pessoas? Como seriam pagas?
Foi quando, um dia, de madrugada, no meu lugar de branco, privilegiado, recebendo meu salário e em isolamento, pensei como eu poderia ajudar, pela internet aqueles que precisavam.
Lendo uma matéria da revista SUPERINTERESSANTE, que falava sobre as mensagens que eram enviadas pelo mar, pensei nas seguintes palavras: internet, navegar, mar, qualquer pessoa poderia receber e ler a mensagem…puft!! (ou euraka!! )
Por que não criar um “mural eletrônico” em que as pessoas colocassem suas contas e quem pudesse, as pagaria? Isso traria um respiro, um conforto, um alívio para quem estava iniciando uma bola de neve de dívidas. Fora desse lugar de privilégio, imagino que não seja fácil, buscar alternativas, fazer cursos onlilne, transformar o negócio para digital e coisas afins. Isso é fácil para nós, privilegiados.
Foi quando resolvi desenvolver um aplicativo em 3 finais de semanas para ajudar a pagar contas básicas de consumo desses vulneráveis sócio economicamente.
A ideia é simples. Quem precisa de ajuda se cadastra, cria um pequeno perfil e registra o código de barras das contas mais urgentes. Depois, só precisa torcer para alguém – de qualquer parte do mundo – decidir pagar.
Importante de dizer que não é empréstimo, não tem taxas de transação, intermediação, de serviço, nada, nada. Uma pessoa que não conhece a outra, paga por entender a situação, por empatia.
O dinheiro doado não passa pela mão de ninguém, nem dos endividados, nem minha. Tudo o que é preciso fazer é copiar o código de barras da conta e pagar. E os resultados têm sido surpreendentes. O Garrafa no Mar chegou ao início de 2022 com quase meio milhão de reais em contas pagas.
A iniciativa é tocada por pessoas físicas de todos os cantos, sem nenhum auxílio público nem de empresas (mas estamos aceitando ajuda, tá?).
As contas são pagas por pessoas desconhecidas, com uma condição financeira um pouco melhor. São os que chamo de “anjos”.
“Too good to be true” (Muito bom para ser verdade) Sim é verdade. E quer mais? Eu não ganho um centavo do montante pago.
Vamos atingir a marca de R$600 mil em contas pagas e com muita confiança, rumo a R$1 milhão!
Até o fim da primeira semana de janeiro, a iniciativa contava com 1.667
doadores – incluindo brasileiros fora do Brasil – e 1.872 beneficiados – alguns deles chegaram a ter mais de uma dezena de contas pagas. Dados levantados pela plataforma mostram que a maior parte delas é de boletos entre R$ 100 e R$ 200, mas há quem precise de ajuda para pagamentos menores, de até R$ 20. Apesar de não ser tão comum, muitas contas mais altas também são pagas.
Hoje, o Garrafa no Mar está em vias de ter CNPJ. Isso permitirá que empresas de tecnologia ajudem no projeto e, quem sabe, que outras se engajem na iniciativa.
Apesar de historicamente, desde pequeno, incentivado pela família a levar brinquedos em orfanatos, eu já ter trabalhado em ONG, de incentivar minha filha a doar roupas e brinquedos, esse projeto tem me transformado muito.
Como eu já disse anteriormente, nós privilegiados, temos uma vaga noção que as pessoas estão em dificuldade, mas quando comecei a trocar mensagens, há quase 2 anos já, percebi a catástrofe que tem sido a pandemia na vida das pessoas menos favorecidas, tive a real ou melhor, a surreal situação dessas famílias.
Portanto, não enxergo o projeto como “o pagador de contas”, mas sim o resgate da dignidade dessas famílias, que não tem a quem recorrer.
Precisamos incentivar a cultura recorrente em nosso país desigual. Divulgue, compartilhe que você ajuda essa ou aquela instituição. Assim você será o porta-voz, o multiplicador e incentivador para sua rede de contatos também doar.
Obrigado Deus, obrigado família, obrigado amigos, obrigado anjos!